O botox é um dos tratamentos estéticos mais procurados do país. A aplicação da toxina botulínica logo abaixo da pele reduz as rugas e linhas de expressão de forma rápida, pouco invasiva e com bons resultados. Entretanto, muito antes de ser popular na busca pelo rejuvenescimento, o botox foi pesquisado originalmente para fins terapêuticos e hoje é um importante aliado de áreas como a neurologia, a urologia e a fisiatria.
A toxina botulínica é fornecida gratuitamente pelo SUS há mais de 10 anos para todos os tratamentos, e seu uso é constante em diversos hospitais do país. Em Porto Alegre, o Hospital São Lucas da PUCRS inaugurou esta semana um ambulatório exclusivamente para a aplicação da toxina na área de neurologia.
As pesquisas com a toxina se iniciaram entre as décadas de 1950 e 1960, quando o oftalmologista americano Alan B. Scott buscava tratamentos alternativos para o estrabismo. Em 1989, os EUA autorizaram o uso do medicamento em humanos e a primeira marca a ser comercializada foi a Botox, do grupo farmacêutico Allergan, e o seu nome se tornou sinônimo da toxina.
Aqui no Brasil, o botox é usado para fins terapêuticos desde 1992, muito antes do uso estético, que começou somente nos anos 2000. As primeiras indicações eram para o estrabismo e o blefaroespasmo (ato de piscar os olhos de maneira descontrolada e excessiva), mas hoje ele já pode ser usado para tratar doenças tão diversas como bexiga hiperativa, cefaleia, paralisias, espasmos musculares e hiperidrose (suor excessivo).
— A toxina botulínica age entre o músculo e terminação nervosa. O nervo passa a mandar menos informação para o músculo e, consequentemente, ele relaxa — explica o neurologista do Hospital São Lucas, Jefferson Becker.
Devido a esse relaxamento a toxina botulínica é uma importante aliada para o tratamento de pessoas que sofrem com algum tipo de rigidez muscular, as chamadas espasticidades. Essa rigidez pode ser consequência de casos como acidente vascular cerebral, crianças com problemas no nascimento, traumatismo craniano ou na região da medula, entre outros.
— A toxina botulínica mudou a história do tratamento das espasticidades, especialmente entre as crianças que sofrem de paralisia cerebral. Com o músculo relaxado, uma criança que antes não conseguia colocar o pé inteiro no chão, por exemplo, passa a conseguir. Assim, seu corpo vai se adaptando e ela aprende a andar melhor, mesmo depois que o efeito do medicamento tenha passado. Isso reduz consideravelmente a necessidade de cirurgias — explica o fisiatra, professor da PUCRS e médico do Hospital São Lucas Carlos Musse.
Vencendo a paralisia
As aplicações de botox fazem parte da vida de Clara de Souza Soares, hoje com oito anos, que sofre de paralisia cerebral, uma sequela do seu nascimento prematuro. A paralisia afeta o lado direito do seu corpo, especialmente nos membros inferiores. Com o uso da toxina botulínica, ela tem mais liberdade em seus movimentos.
— A toxina era o único tratamento da Clara até os seis anos, quando ela fez uma importante cirurgia, e sempre teve ótimos resultados. Hoje, seguimos com as aplicações e, com a ajuda de uma órtese, ela caminha muito bem e leva uma vida normal — conta a professora, psicopedagoga e mãe da Clara, Elisangela de Souza Costa.
Combate à cefaleia
Um dos mais recentes usos da toxina botulínica é no tratamento da enxaqueca crônica. Por meio de aplicações logo abaixo da pele, o medicamento é capaz de impedir que as terminações nervosas que causam dor cheguem ao músculo.
A secretaria executiva Ana Paula Medeiros, 29 anos, sofre com dores de cabeça desde a adolescência. Nos últimos dois anos, sentiu uma piora nas crises e procurou ajuda médica. Após diversos tratamentos sem resultado, seu neurologista indicou a aplicação do botox, em maio deste ano.
— Eu tinha crises muito fortes duas ou até três vezes por semana e tomava muitos analgésicos. Depois da aplicação, as dores aparecem com bem menos frequência — conta a jovem.
Na urologia
Outra área da medicina que utiliza a toxina botulínica é a urologia, especialmente no tratamento da chamada bexiga hiperativa, quando o paciente sente uma vontade urgente e desconfortável de urinar, ou quando ele precisa excessivamente ir ao banheiro no decorrer do dia. A aplicação da toxina deve ser feita diretamente no músculo da bexiga, por meio de uma endoscopia.
— Nos casos em que a medicação oral e outros tratamentos não apresentam resultados, o uso de botox pode ser uma boa alternativa para evitar as contrações involuntárias do músculo, que causam o problema —explica o urologista do Mãe de Deus Center e do Hospital Santa Casa de Porto Alegre, Márcio Averbeck.
O que é a toxina botulínica
A toxina botulínica é um composto altamente venenoso, formado por um complexo de proteínas e produzido pela bactéria Clostridium botulinum. A bactéria produz sete tipos de toxina, nomeadas pelas letras A, B, C, D, E, F e G. A toxina A é a mais potente e a única comercializada no Brasil. Sua principal aplicação é intramuscular e seu efeito é naturalmente revertido pelo corpo em aproximadamente quatro meses.
Nem tudo é botox
Apesar de o nome botox ser conhecido como um sinônimo para a toxina botulínica, há importantes diferenças entre as diversas marcas do produto disponíveis no mercado. Por se tratar de um medicamento biológico, ela tem características específicas e diferentes indicações, efeitos e dosagens. Nem todas as marcas são autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para realizar todos os procedimentos com o medicamento.